O
joelho é a maior e uma das mais complexas articulações do corpo humano.
Apresenta uma cinemática articular peculiar e uma estrutura cápsulo-ligamentar
complexa, por ser uma articulação desenvolvida para suportar carga.
Os
estabilizadores do joelho podem ser divididos em estáticos (meniscos,
ligamentos e cápsulas) e dinâmicos (músculos e tendões) e, dentre os ligamentos
que estabilizam o joelho, cabe destaque aos intracapsulares, os quais são: o ligamento cruzado anterior (LCA) e o ligamento cruzado posterior (LCP) que firmam a articulação,
essencialmente, no sentido ântero-posterior e rotacional, prevenindo lesões.
O LCA apresenta
relevante contribuição sensorial ao controle motor e à estabilidade articular. Essa contribuição é dada por meio da capacidade
do LCA influenciar a ativação muscular necessária para manter a integridade da
articulação durante o movimento ante a solicitação mecânica imposta a ele. No joelho, mecanorreceptores como terminações
de Ruffini, corpúsculos de Pacini e órgãos tendinosos de Golgi estão presentes
no LCA, no ligamento cruzado posterior e nos meniscos. Desse modo, o LCA não se configura apenas como
restritor mecânico, mas fornece informação sensorial ativando a estabilização
muscular reflexa.
O LCA é
descrito como o mais acometido nas lesões no joelho (46%), sendo relacionadas a
atividades esportivas. A alta incidência de lesões neste ligamento leva a uma
evidência de instabilidade do joelho impondo um recurso terapêutico apropriado,
uma vez que esta lesão pode trazer consequências desagradáveis para as
atividades da vida diária. O seu mecanismo de
lesão é variável, porém o mais comum é o indivíduo com seu pé fixo ao solo, em
flexão do joelho, tenta mudar de direção, com desaceleração e estresse em
valgo. A lesão também pode ocorrer por hiperextensão associado à rotação
interna do joelho ou por contato, quando a pessoa sofre uma força em valgo no
joelho.
Após a lesão do LCA,
é comum a instabilidade de joelho, que pode progredir para mudanças funcionais
e lesões de outras estruturas articulares. Também é comum a presença de dor,
edema e em seguida uma diminuição da amplitude de movimento (ADM), existindo
uma grande possibilidade de um surgimento de atrofia do quadríceps.
Quando ocorre uma
lesão, os mecanorreceptores também são afetados, gerando alteração na aferência
proprioceptiva, comprometendo o mecanismo protetor de controle neuromuscular,
determinando assim déficit na atividade muscular antecipatória (latência na
estabilização reflexa), expondo as estruturas estáticas à lesão diante de
forças e traumas inesperados.
Na
maioria dos casos, o tratamento da ruptura do LCA é cirúrgico, que é indicado principalmente
para indivíduos ativos, trabalhadores, atletas profissionais ou recreacionais,
cuja articulação do joelho desempenha papel fundamental. Atualmente a cirurgia de reconstrução do LCA se
tornou um dos procedimentos mais populares na cirurgia do joelho, apresentando
em média 90% de sucesso com relação a restaurar a estabilidade do joelho e à
satisfação do paciente.
As
lesões do joelho apresentam consequências variadas para a função e qualidade de
vida do indivíduo, por isso, a reabilitação completa desses sujeitos torna-se
essencial. A fisioterapia possui
um papel fundamental para que o indivíduo recupere a funcionalidade, através da
utilização de métodos terapêuticos, favorecendo a diminuição das sequelas, além
de melhorar a capacidade funcional e adaptativa, em suas atividades de vida
diárias. A reabilitação deve minimizar os efeitos adversos da imobilização sem
sobrecarregar os tecidos em fase de cicatrização, e, assim, permitir ao
indivíduo, o retorno ao mesmo nível funcional anterior à lesão.
Alguns estudos, tais
como os de Birmingham et al. (2001) e de Henriksson; Ledin; Good (2001),
sugerem que a reconstrução bem-sucedida do LCA se correlaciona mais com a
restauração da propriocepção do que com a estabilidade mecânica, e isso se
justifica pelo fato de o ligamento lesado ser substituído por um enxerto, que
não tem as mesmas características do ligamento, sem restauração dos mecanorreceptores
originais e conexões nervosas.
Andrews; Harrelson;
Wilk (2005), Risberg et al. (2001) e Williams et al. (2001) afirmam que há redução da aferência
proprioceptiva do joelho quando ocorre uma ruptura total do LCA ou após a sua
reconstrução, e que os déficits na propriocepção resultantes das lesões
ligamentares não afetam apenas os receptores articulares mas também a função
muscular, com a consequente diminuição efetiva dos receptores musculares.
O déficit sensorial
pode ser minimizado depois de lesão ou de cirurgia por meio do treinamento
sensório motor, apurando a função estabilizadora reflexa e diminuindo os riscos
de novas lesões. Estudos têm mostrado que programas de exercícios que estimulam
as vias sensoriais proprioceptivas podem vir a melhorar a estabilidade do
equilíbrio, reduzindo a incidência de lesões.
O
treino proprioceptivo, atualmente, é considerado como parte fundamental da
reabilitação do pós-operatório de reconstrução do LCA, visto que no processo
cirúrgico há uma perda dos receptores proprioceptivos e, consequentemente,
pode-se verificar um déficit na proprioceptivo e equilíbrio do segmento
lesionado.
Dentre
as técnicas mais utilizadas, podem ser citadas as técnicas com uso de bola
suíça, diversos tipos de pranchas de equilíbrio e até em exercícios de solo. As
técnicas mais inovadoras incluem bandagens e faixas que irão adicionar um
estímulo sensorial ao joelho e também pranchas vibratórias de corpo inteiro.
De
acordo com esses estudos, a propriocepção não será completamente restaurada após
o treinamento, pois os receptores presentes no enxerto possuem características
diferentes dos receptores encontrados no LCA. Contudo os efeitos causados pelo
déficit proprioceptivo serão minimizados, tendo como resultado uma melhora na
qualidade de vida de pessoas que foram submetidas à reconstrução do LCA.
Em
diversos estudos, foi comparado o treinamento proprioceptivo com o tratamento
convencional. Contudo, concluiu-se que na verdade os dois tipos de reabilitação
devem ser mesclados para melhores resultados no pós-operatório de LCA.
Referencias
Andrews JR;
Harrelson GL; Wilk KE.
Reabilitação física do atleta. 3ª ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, p. 419
a 420, 2005.
Henriksson M; Ledin T; Good
L. Postural control after anterior cruciate ligament
reconstruction and functional rehabilitation. Am J Sports Med. Vol. 29, nº 3, p. 359 a 366, 2001.
Birmingham TB; Kramer JF;
Kirkley A; Inglis JT; Spaulding SJ; Vandervoort AA. Knee bracing
after ACL reconstruction: effects on postural control and proprioception. Med Sci Sports Exerc. Vol 33, nº 8, p. 1253 a 1258, 2001.
Risberg MA, Mork M, Jenssen HK, HOLM I. Design and implementation of a neuromuscular training program
following anterior cruciate ligament reconstruction. J Orthop Sports Phys Ther. Vol. 31, nº 11, p. 620 a 631, 2001.
Williams G; Chmielewski T; Rudolph K; Buchanan T;
Snyder-Mackler L. Dynamic Knee Stability: current
theory and implications for clinicians and scientists in J. Orthopaedic Sports Physical Therapy Vol.
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556, 2001.
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