domingo, 8 de junho de 2014

Recrutamento alveolar

Os recursos terapêuticos para expansão ou reexpansão pulmonar no manejo dos pacientes criticamente enfermos surgiram pela necessidade de se prevenir ou tratar a redução do volume pulmonar.
O colapso alveolar é comum em pacientes com doenças respiratórias e/ou neuromusculares, pacientes acamados por longos períodos, pacientes intubados sob ventilação mecânica e em diversos tipos de pós-operatório, principalmente no pós-operatório de cirurgias torácicas e abdominais. Este colapso causa perda volumétrica com consequente redução da capacidade residual funcional (CRF), podendo levar à hipoxemia e aumento nos riscos de infecção e lesão pulmonar caso não seja revertido.
A terapia de expansão pulmonar tem por objetivo principal incrementar o volume pulmonar através do aumento do gradiente de pressão transpulmonar, seja por redução da pressão pleural ou por aumento da pressão intra-alveolar. 
As manobras de recrutamento alveolar consistem em insuflações sustentadas para abrir as unidades alveolares colapsadas.

Expansão pulmonar por diminuição da pressão pleural

Nesta terapia a diminuição da pressão pleural ocorre devido a contração muscular inspiratória, o que torna a pressão pleural mais negativa. Quanto mais potente for a contração muscular, maior será o gradiente de pressão transpulmonar gerado e, consequentemente, maior será o volume de gás mobilizado.
Os exercícios respiratórios, também conhecidos como exercícios de inspiração profunda e a espirometria de incentivo estão indicados para a prevenção e tratamento de atelectasias.

Pressão positiva intermitente

É uma técnica que pode ser utilizada em pacientes intubados e não-intubados e consiste na aplicação de pressão positiva nas vias aéreas durante a fase inspiratória. Pode ser realizada com ventiladores ciclados a volume, pressão, tempo e fluxo, ou com hiperinsuflador manual (ambú).

Pressão positiva expiratória (EPAP)

Consiste na aplicação de pressão positiva na fase expiratória. Esta pressão é produzida por dispositivos que geram resistência ao fluxo expiratório, como válvulas spring-loaded, que podem estar conectados à máscaras, bocais ou diretamente na via aérea artificial.

Pressão positiva contínua (CPAP)

É obtida com um gerador de fluxo e consiste na aplicação de PEEP (pressão positiva expiratória final) associada a um fluxo inspiratório nas vias aéreas. Pode ser utilizada em pacientes em ventilação espontânea com ou sem a presença de vias aéreas artificiais.

Ventilação em dois níveis de pressão (Bilevel)

É um modo de ventilação não-invasiva que tem característica em dois níveis de pressão positiva, que são aplicadas na inspiração e na expiração, gerando aumento do volume pulmonar. A pressão aplicada na fase inspiratória sempre é maior que na fase expiratória, permitindo que mesmo sem a cooperação do paciente ocorra aumento da pressão intrapulmonar.

Hiperinsuflação manual (ambú)

Consiste em insuflações lentas e profundas consecutivas, com acréscimo do volume inspirado, seguida ou não de pausa inspiratória, e rápida liberação da pressão. Promove um aumento do fluxo aéreo para as regiões atelectasiadas através dos canais colaterais, do mecanismo de interdependência alveolar e da renovação do surfactante alveolar. Além disso, favorece o deslocamento da secreção pulmonar das vias aéreas mais periféricas para as mais centrais.

Hiperinsuflação mecânica (PEEP)

Aumento da pressão positiva na fase inspiratória com o ventilador permitindo controlar as pressões utilizadas. Contudo, ainda existe grande controvérsia em relação aos valores de PEEP que devem ser utilizados. Muitos autores defendem que os valores de PEEP devem variar entre 20 e 40 cmH2O, em três aplicações de 30 segundos. Mas, existe ainda um grupo de autores que defendem valores maiores de 45cmH2O. O único consenso em relação à técnica é que a oferta de volumes pulmonares maiores pode aumentar a pressão transpulmonar e favorecer a expansão alveolar e a desobstrução das vias aéreas.


As manobras de recrutamento alveolar podem ser consideradas um método rápido e fácil, sendo efetivo na correção da hipoxemia e restauração do volume corrente exalado, porém, os benefícios dessas técnicas vão além dos efeitos mecânicos e da oxigenação da atelectasia. A homogenização da ventilação associa-se à redução de lesão pulmonar, à redução da infecção respiratória e redução do tempo de permanência no ventilador mecânico.

Referências

AULER JUNIOR, JOC; NOZAWA, E; TOMA, EK; DEGAKI, KL; FELTRIM, MIZ; MALBOUISSUM, LMS. Manobra de recrutamento alveolar na reversão da hipoxemia no pós-operatório imediato em cirurgia cardíaca. Rev Bras Anestesiol, vol. 57, nº 5, p. 476-488, 2007.

FRANÇA, EET; FERRARI, FR; FERNADES, PV; CAVALCANTI, R; DUARTE, A; AQUIM, EE; DAMASCENO, MCP. Força tarefa sobre a fisioterapia em pacientes críticos adultos: Diretrizes da Associação Brasileira de Fisioterapia Respiratória e Terapia intensiva (ASSSOBRAFIR) e Associação de Medicia Intensiva Brasileira (AMIB). [Internet]. [citado 2014 Jun 08]. Disponível em: http://www.amib.org.br/pdf/DEFIT.pdf

MALBOUISSUM, LMS; HUMBERTO, F; RODRIGUES, RR; CARMONA, MJC; AULER JUNIOR, JOC. Atelectasias durante anestesia: fisiopatologia e tratamento. Rev Bras Anestesiol, vol. 58, nº 1, 2008.


quarta-feira, 4 de junho de 2014

Úlceras de pressão

Úlcera de pressão (UP) é qualquer lesão causada por pressão constante que resulta em danos nos tecidos subjacentes e sua formação depende da intensidade e da duração da pressão exercida sobre a pele e da capacidade da mesma e dos tecidos subjacentes de tolerar essa pressão.
A UP pode postergar o processo de recuperação funcional por limitar a execução plena dos exercícios necessários a reabilitação, prolongar o período de hospitalização em até cinco vezes e, na pior das hipóteses, pode levar ao óbito por infecção generalizada.
É considerada um problema grave, especialmente em idosos, nas situações de adoecimento crônico-degenerativo, podendo também ser encontradas em diversas situações clínicas tais como a falta de sensibilidade, déficit de movimento, distúrbios vasculares e alteração na percepção.
No Brasil, ainda não se tem dados significativos relacionados à incidência, à prevalência e aos custos, para mostrar a real situação do nosso país, pois existem ainda poucos estudos realizados a respeito da UP.
Estima-se que 17% dos pacientes hospitalizados desenvolvem ou são susceptíveis às UPs. Um estudo realizado por Blannes et al. (2004) concluiu que 68% dos pacientes de um hospital que apresentavam UP, desenvolveram a lesão no hospital e que 34% foi internada com uma pré-úlcera, que piorou durante o período de hospitalização.
O mecanismo de formação de UPs consiste da interação de 3 fatores: fisiopatológicos ou predisponente (corresponde ao conjunto de fatores de risco ao qual o paciente agrega), biomecânicos ou determinantes (consistem na atuação das forças de compressão, reação e cisalhamento, esta última sendo a resultante e responsável pela isquemia e descontinuidade estrutural do tecido) e os fatores agravantes (como a umidade proveniente tanto da incontinência fecal quanto da urinária e pela sudorese intensa).
As proeminências ósseas por serem cobertas apenas por uma fina camada de tecido subcutâneo ou muscular tornam-se suscetíveis ao desenvolvimento de UP’s. Pacientes acamados, debilitados, semicomatosos ou inconscientes, que apresentam áreas de anestesia predispõem-se a desenvolver UPs por isquemia. As localizações mais acometidas pelas UPs, portanto, são a região isquiática (24%), sacrococcígea (23%), trocantérica (15%), calcânea (8%), maléolos laterais (7%), cotovelos (3%), região occipital e escapular (1%).
A classificação adotada para UP baseia-se na profundidade do acometimento e no limite entre os tecidos lesados:
  • Grau I: é uma resposta inflamatória aguda, nas camadas da pele. Apresenta eritema em pele íntegra, persistente mesmo após o alívio da pressão sobre o local. A identificação da lesão grau I é dificultada em indivíduos com pele negra.

  • Grau II: perda tecidual envolvendo a epiderme, derme ou ambas. A úlcera é superficial e apresenta-se clinicamente como uma bolha, abrasão ou cratera rasa.
  • Grau III: comprometimento do tecido subcutâneo, podendo-se estender mais profundamente, até a fáscia muscular subjacente. Representa perda completa da pele.
  • Grau IV: comprometimento mais profundo, com destruição extensa de tecidos, ulceração de espessura completa com tração extensiva, necrose tecidual, dano ao músculo, ossos e estruturas de suporte.

Dependendo do nível e da profundidade da lesão nos tecidos, as úlceras podem trazer complicações, como osteomielite, septicemia e mesmo levar o paciente a óbito. Além das perdas financeiras ocasionadas ao paciente e a familiares, o problema traz também transtornos psicológicos e impedem ou dificultam a participação do indivíduo em programas de reabilitação.
Esse tipo de lesão representa grande ameaça ao indivíduo, pois causa desconforto, e uma série de distúrbios ao organismo, como perda de proteínas orgânicas, fluídos e eletrólitos. Podendo então o paciente apresentar baixa resistência imunológica, o que possibilita a entrada de microorganismos como estreptococos, estafilococos e Escherichia coli, o que aumenta os dias de internação do paciente.
Aproximadamente 95% das UPs são evitáveis, pelo que se torna indispensável empregar todos os meios disponíveis para realizar uma eficaz prevenção e tratamento das UPs já instalada.
A adoção e implementação de medidas preventivas e de um tratamento inicial agressivo para as UPs podem significar medidas mais econômicas, reduzindo a necessidade de uma assistência de alto padrão, equipamentos caros e intervenções cirúrgicas.
No Brasil, porém, o trabalho preventivo em geral não ocorre ou não é realizado adequadamente, fazendo com que a prevalência de UPs no ambiente hospitalar se torne extremamente alta.
É indiscutível que a identificação e o tratamento precoce permitem impedir a progressão e aceleraram a regeneração da UP. Este fato influencia de maneira positiva na redução do custo e evolução do tratamento.
O tratamento local das UPs pode ser dividido em conservador e cirúrgico de acordo com a classificação:
  • Úlceras graus I e I: podem ter cicatrização espontânea sem intervenção cirúrgica, desde que a ferida seja limpa e que seja impedida a pressão na área. Esta limpeza das UPs com água e sabão ou algum outro meio surfactante é o modo simples e efetivo de se limpar lesões superficiais, desde que seja feita com frequência e de preferência seja conservada seca. Pode-se proteger a pele ao redor da úlcera com adesivos espessos com o objetivo de prevenir a maceração da pele. Já a qualidade da pele regenerada por tratamento conservador é fina, sem glândulas sebáceas ou sudoríparas. O epitélio é geralmente seco e fino com suprimento sanguíneo pobre e deve ser lubrificado frequentemente com vaselina e hidratantes.
  • Úlceras graus III e IV: de maneira geral necessitam de tratamento cirúrgico. As medidas conservadoras, consistindo de desbridamento local, diminuição da pressão local e trocas diárias de curativo têm pouca eficácia, uma vez que a úlcera crônica se desenvolve.

Em geral, o tratamento conservador de uma UP deve incluir medidas multidisciplinares para reduzir ou eliminar os fatores desencadeantes, promover cuidados específicos da ferida e otimizar o estado geral e nutricional do enfermo. O tratamento inclui limpeza, revestimento e aplicação de agentes físicos, além de desbridamento e investigação sobre colonização, quando necessário. Destes, a higienização adequada e mudança de decúbito são essenciais, e o suporte da enfermagem indispensável.
Como as úlceras cutâneas crônicas são de difícil cicatrização e considerável incidência, torna-se necessário uma abordagem multidisciplinar mais eficiente.        
A fisioterapia, na especialidade dermatofuncional, tem como objetivo, nos processos ulcerativos, a redução no período de cicatrização destes, possibilitando aos indivíduos um retorno mais rápido às suas atividades sociais e de vida diária, trazendo uma melhora na qualidade de vida de pessoas portadoras de úlceras cutâneas. A fisioterapia tem dedicado esforços científicos a fim de aprimorar muitas das suas técnicas terapêuticas, porém, no Brasil, existem poucos estudos plausíveis para a validação da reparação tecidual.

Referências

BLANES, L. et al. Avaliação clínica e epidemiológica das úlceras por pressão de pacientes internados em um hospital de São Paulo. Rev Assoc Med Bras, vol. 50, nº 2, p. 182-187, 2004.

CHRISTOFOLETTI, DC; SOUZA, MVG; CHINGUI, LC; SEVERI, MTM. Ações do laser e da microcorrente em lesões cutâneas. Anuário da produção de iniciação científica discente, vol. 13, nº 16, p. 93-101, 2010.

COSTA, PM; STURTZ, G; PEREIRA, PF; FERREIRA, CM; FILHO, BPT. Epidemiologia e tratamento das úlceras de pressão: Experiência de 77 casos. Acta Ortop Bras, vol. 13, nº. 3, p. 124-133, 2005.

DELIBERATO, PCP. Fisioterapia preventiva: fundamentos e aplicações. São Paulo: Manole, 2002.

DELISA, JA; GANS, BM. Tratado de Medicina de Reabilitação: princípios e prática. 3ª.ed. São Paulo: Manole, 2002.

FERNANDES, LM. Úlcera de pressão em pacientes críticos hospitalizados: uma revisão integrativa da literatura. Dissertação de mestrado. Curso de Enfermagem, Universidade de São Paulo/Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, 2000, p.168.

FERREIRA, LM; CALIL, JA. Etiopatogenia e tratamento das úlceras por pressão. Revista Diagnóstico e tratamento, vol. 6, nº 3, p. 36-40, 2001.

Goldman, L; Ausiello, D. Cecil: Tratado de Medicina Interna. 22 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005
GONÇALVES, CR; SAY, GK; RENNÓ, MCA. Ação do laser de baixa intensidade no tratamento de úlceras cutâneas. Rev. de fisioter. Univ. Cruz Alta, vol. 2, nº. 3, p. 11-15, dez., 2000.

LANGEMO, DK; ANDERSON, J; VOLDEM, CM. Nursing quality outcome indicators. North Dakota Study. J Nurs Adm, vol. 32, nº2, p.98-105, 2002.

LOURO, M; FERREIRA, M; PÓVOA P. Avaliação de protocolo de prevenção e tratamento de úlceras de pressão. Rev Bras Ter Intensiva, vol. 19, nº 3, p. 337-341, 2007.

MARINI, FM. Úlceras de Pressão. In: FREITAS, VE; PY, L; NERI, LA; CANÇADO, XAF; GORZONI, LM; ROCHA, MA. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 1ª. ed. Rio  Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.

MEDEIROS, ABF; LOPES, CHA; JORGE, MS. Análise da prevenção e tratamento das úlceras por pressão propostos por enfermeiros. Rev. Esc. Enferm, USP, vol. 43, nº. 1, p. 223-238, 2009.

Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm., v. 17, n. 4, p. 758 – 764, 2008.

MOURA, CEM; SILVA, LLM; GODOY, JRP. Úlceras de pressão: prevenção e tratamento. Univ. Ci. Saúde, vol. 3, nº 2, p. 275-286, 2005.

O’CONNOR, CK; KIRSHBLUM, CS. Úlcera por Pressão. In: DELISA, AJ; GANS, MB. Tratado de Medicina e Reabilitação – Princípios e prática. 3ª. ed., v. 2, São Paulo: Editora Manole, 2002.

PETROLINO, HMBS. Úlcera de pressão em pacientes de unidade de terapia intensiva: incidência, avaliação de risco e medidas de prevenção. São Paulo. [Dissertação] – Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo (USP), 2002.

Rocha, JA; Miranda, MJ; Andrade, MJ. Abordagem terapêutica das úlceras de pressão – Intervenções baseadas em evidencias. Acta Med Port, vol. 19, p. 29-38, 2006.

SAMPAIO, RF; MANCINI, MC. Estudos de revisão sistemática: um guia para síntese criteriosa da evidencia científica. Revista Brasileira de Fisioterapia, vol. 11, nº 1, p. 83-89, 2007.

Souza, DMST; Santos, VLCG. Fatores de risco para o desenvolvimento de úlceras por pressão em idoso institucionalizado. Rev Latinoam Enfermagem, vol. 15, nº 5, p. 958-964, 2007.

von Kummer, R; Wahlgren, N; Toni, D; emore, R; Kna,  K. The integrative review: updated methodology. J Adv Nurs., v. 52, n. 5, p. 546 – 553, 2005.