terça-feira, 20 de agosto de 2013

Gasometria arterial

Trata-se do procedimento realizado através de uma punção arterial para a medição direta da concentração do íon hidrogênio (pH), da pressão de oxigênio (PO2) e da pressão de dióxido de carbono (PCO2) no sangue arterial. Permite avaliar o estado de oxigenação, ventilação e condições ácido-básica do paciente.
Também podem ser dosados, dependendo do gasômetro usado, os níveis de sódio, potássio, cálcio iônico e cloreto.
Frequentemente, essa amostra é coletada na artéria radial, próximo ao punho, sem a necessidade de jejum ou qualquer preparação prévia. Todavia, também pode ser colhida pela artéria braquial ou femoral.
Através da amostra de sangue arterial, o laboratório pode determinar os valores de oxigênio e de dióxido de carbono, assim como a acidez do sangue, pela comparação dos valores presentes na amostra com os padrões internos do gasômetro. 
Normalmente, os valores gasométricos são pesquisados quando o paciente apresenta um quadro clínico sugestivo de alguma anormalidade na oxigenação, na ventilação e no equilíbrio ácido-básico. Utiliza-se também em situações que objetivam avaliar alterações na terapia que podem modificar a oxigenação, tais como a mudança na concentração de oxigênio inspirado (FiO2), níveis aplicados de pressão expiratória final positiva (PEEP), pressão nas vias aéreas, mudança na frequência respiratória, alterações no volume corrente ou administração de bicarbonato de sódio ou terapia com acetazolamida.


Equilíbrio ácido-básico

A concentração de hidrogênio livre no organismo depende da ação de substâncias que disputam o hidrogênio entre si: as substâncias que tendem a ceder oxigênio em uma substância são chamadas de ácidos; já as substâncias que tendem a captar hidrogênio em uma solução são chamadas de base. Temos uma acidose quando os níveis de ácido no organismo estão superiores aos níveis de base, enquanto que na alcalose, os níveis de base serão superiores aos níveis de ácido.
No organismo, o ácido mais comum é o ácido carbônico que é derivado da interação entre o CO2 presente no sangue com água (H2O). A base mais comum no organismo, por sua vez, é resultado da interação entre CO2 e H2O provenientes do metabolismo celular.
Os pulmões e os rins são os órgãos responsáveis pelo equilíbrio ácido-básico do organismo. Alterações nesse equilíbrio podem resultar em alterações do pH no organismo.

Parâmetros normais para gasometria arterial

pH
7,35 – 7,45
PaO2
80 – 100 mmHg
PaCO2
35 – 45 mmHg
BE
-2 – +2
BCO3
22 – 28 mEq/L
SaO2
> 95%

pH: Potencial Hidrogeniônico
É a medida da acidez ou da alcalinidade de uma solução. A avaliação do pH serve para determinar uma alcalose (pH > 7,45) ou a presença de uma acidose (pH < 7,35). Um pH normal, entretanto, não indica necessariamente a ausência de um distúrbio ácido-básico, dependendo do grau de compensação.

PaO2
A PaO2 (PO2) exprime a eficácia das trocas de oxigênio entre os alvéolos e os capilares pulmonares. Depende diretamente da pressão parcial de oxigênio no alvéolo, da capacidade de difusão pulmonar deste gás, da existência de shunt anatômico ou patológico, e da relação ventilação/perfusão (V/Q) pulmonar. 

PaCO2
A PaCO2 (PCO2) do sangue arterial exprime a eficácia da ventilação alveolar, sendo praticamente o mesmo valor da PaCO2 alveolar, dada a grande difusibilidade desse gás. Se a PaCO2 estiver menor que 35mmHg, o paciente está perdendo muito CO2 através da respiração (hiperventilando). Contudo, se a PaCO2 estiver maior que 45mmHg, o paciente está retendo CO2.
Os pulmões são os principais responsáveis pelo equilíbrio de PaCo2 no organismo.

BE: Base Excess
Sinaliza a quantidade de bases dissolvidas no plasma sanguíneo. Alterações nos valores da BE indicam distúrbios metabólicos.

HCO3: bicarbonato
As alterações de bicarbonato no plasma podem desencadear desequilíbrios ácido-básicos por distúrbios metabólicos. Se o paciente estiver com os valores de HCO3 acima de 28mEq/l, ele está retendo bicarbonato no organismo, enquanto se os valores estiverem abaixo de 22mEq/l, ele está perdendo bicarbonato.
Os rins são os principais responsáveis pelos valores de HCO3 no organismo, mas o trato gastrointestinal (TGI) e as glândulas sudoríparas também são responsáveis pela regulação de bicarbonato no organismo.

SaO2 (SatO2): saturação de O2
A saturação de O2 corresponde à relação entre o conteúdo e a capacidade de oxigênio no sangue.

Acidose respiratória

Aumento da PaCO2
Qualquer fator que reduza a ventilação pulmonar aumenta a concentração de CO2, que, consequentemente, vai aumentar os íons de H no sangue, causando desta maneira uma redução do pH, resultando em uma acidose respiratória.

Hipoventilação →  Hipercapnia (PaCO2 > 45mmHg) → Acidose respiratória

Manifestação clínica
A principal característica da acidose respiratória é a hipoventilação.

Etiologia
  • Depressão do sistema nervoso central (lesão neurológica, drogas, álcool...)
  • Doenças neuromusculares (Poliomelite, Polirradiculoneurites)
  • Debilidade da musculatura respiratória
  • Patologias que retêm CO2 (DPOC, enfisema pulmonar, asma agudizada...)
  • Obstrução das vias aéreas (secreção, corpo estranho)
  • Infecções respiratórias agudas
  • Traumatismo torácico, deformidades severas
  • P.O. cirurgia abdominal alta, toracotomias
  • Distensão abdominal severa

Alcalose respiratória

Redução da PaCO2
Quando a ventilação alveolar está aumentada, a PaCO2 alveolar diminui, consequentemente, haverá diminuição da PCO2 arterial menor que 35mmHg, caracterizando uma alcalose respiratória.

Hiperventilação → Hipocapnia (PaCO2 < 35mmHg) → Alcalose respiratória

Manifestação clínica
A principal manifestação clínica é a hiperventilação, mas em casos graves pode-se observar parestesias e câimbras nas extremidades.

Etiologia
  • Resposta fisiológica à dor, ansiedade ou medo
  • Aumento das demandas fisiológicas (febre, sepse)
  • Hiperventilação por ventilação mecânica
  • Lesão do sistema nervoso central (tumores, encefalites, hipertensão intracraniana)
  • Estimulantes respiratórios
  • Hipóxia em grandes altitudes
  • Alcalose pós acidose

Acidose metabólica

Redução de HCO3
O distúrbio ácido-básico que mais frequentemente se observa na prática clínica é a acidose metabólica. A administração de HCO3- por via venosa está indicada quando o pH < 7.25, na maioria dos casos.

↓ HCO3- ( < 22  mEq/L)   e   ↓ pH ( < 7,35)

Manifestações clínicas
Na acidose metabólica leve, as manifestações clínicas são aquelas decorrentes da própria intoxicação. 
Nos casos de acidose mais grave (pH < 7.2, bicarbonato < 13 mEq/L), independente da causa de 
base, podem ser produzidos efeitos diretos cardiovasculares, respiratórios, gastrointestinais e em SNC. A contratilidade do miocárdio é afetada e pode progredir para choque circulatório. A respiração se torna anormal, mais profunda e então mais freqüente. A depressão de SNC evolui para o coma. Dor abdominal e náusea podem estar presentes. Hipercalemia é uma complicação da acidose, que resulta em potencial risco de vida.

Etiologia
  • Insuficiência Renal; 
  • Cetoacidose diabética; 
  • Ingestão excessiva de ácidos; 
  • Perdas excessivas de bases (diarréias); 
  • Elevação de ácido láctico na glicogenólise muscular (aumento do trabalho respiratório); 
  • Hipóxia (insuficiência respiratória, choque circulatório); 
  • Hipertermia, doenças infecciosas, anorexia. 

Alcalose metabólica

Aumento dos níveis de HCO3
A alcalose metabólica verifica-se quando o corpo perde muito ácido. Pode desenvolver-se quando a excessiva perda de sódio ou de potássio afeta a capacidade renal para controlar o equilíbrio ácido-básico do sangue.

↑ HCO3- ( > 28 mEq/L)   e   ↑ pH ( > 7,45)

Manifestações clínicas
A manifestação clínica na alcalose metabólica pode vir acompanhada de história recente de perda 
excessiva do conteúdo gástrico, administração de altas doses de diurético de alça ou sobrecarga de álcali em pacientes com falência renal, irritabilidade, hiperexcitabilidade, confusão mental, as vezes semelhante a intoxicação alcoólica, bradipnéia, cianose às vezes extrema, fraqueza muscular, redução do peristaltismo gastrointestinal e poliúria, sugerem depleção associada de K+. Tetania pode ocorrer devido à diminuição de cálcio ionizado no soro.

Etiologia
  • Oferta excessiva de bicarbonato; 
  • Perda de suco gástrico por vômitos ou aspirações de sondas gástricas; 
  • Uso abusivo de diuréticos e corticosteróides; 
  • Insuficiência respiratória crônica (retentores crônicos de CO2)

Mecanismos compensatórios

Na acidose respiratória, a persistente elevação da pressão parcial de CO2, repercute a nível renal e após um período de 12 a 48 horas já se consegue detectar diminuição da eliminação renal de HCO3- com maior eliminação de H+ na urina. O aumento da reabsorção renal de HCO3- constitui o principal mecanismo de compensação renal à acidose hipercápnica. O HCO3- elevando-se no sangue, tenderá a normalizar o pH. A acidose respiratória compensada apresentará pH normal ou próximo do normal, PCO2 elevada e HCO3-.
Numa insuficiência pulmonar, devido a hipoxia ou ao aumento de trabalho muscular respiratório, a produção de ácido láctico pode estar aumentada, e este é tamponado no plasma pelo bicarbonato, com conseqüente diminuição dos seus níveis, diminuindo ainda mais o pH e levando a uma Acidose Mista. 
Na hipocapnia de longa duração, a eliminação renal de bicarbonato está aumentada, levando a correção do pH do sangue. A alcalose respiratória compensada apresentará um pH normal ou próximo do normal com níveis de bicarbonato baixos. 
A associação de alcalose respiratória e alcalose metabólica, Alcalose Mista, é freqüente em 
pacientes com insuficiência respiratória quando hiperventilados mecanicamente, e ocorrem perdas de suco gástrico ou uso de diuréticos.
Na acidose metabólica, a compensação ocorrerá pela hiperventilação alveolar secundária ao aumento de H+ no plasma e no líquor, levando a uma diminuição da PCO2. Essa hiperventilação tenderá a corrigir o pH do sangue.
Na alcalose metabólica, o mecanismo de compensação não é tão eficiente. Embora o aumento de HCO3- no líquor deprima a respiração, sua passagem pela barreira liquórica é muito lenta. Daí o fato de que a depressão respiratória não ser observada com freqüência na clínica. 

Referências

  1. Gasometria: interpretação e quando intervir; Ana Cristina Simões e Silva, Professora Asisitente Mestre do PED-UFMG
  2. PARSONS, P. E.; HEFFNER, J. E.. Segredos em Pneumologia: respostas necessárias ao dia-a-dia em rounds, na clínica, em exames orais e escritos. Ed. Artmed – Porto Alegre 2000
  3. PRESTO, B. L. V.; PRESTO, L. D. N.. Fisioterapia Respiratória: Uma nova visão. Ed.Bruno Presto – Rio de Janeiro 2003
  4. SILVEIRA, I. C.; O Pulmão na prática médica. 3º ed – Rio de Janeiro. Ed. de Publicações Médicas, 1992

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